Normalmente os debates à volta dos custos de transportes são dominados por questões como: quanto custa construir uma estrada ou operar uma linha de autocarro ou de metro. No entanto existem outros custos, tais como poluição, impacto nas alterações climáticas, acidentes, congestionamentos, etc., que, apesar de menos óbvios, não são por isso menos reais e os quais têm de ser pagos. Estes custos externos dos transportes, só por si, na EU representam 500 mil milhões de Euros (4% do PIB)[1].
A capital dinamarquesa utiliza a análise custo-benefício, onde se incluem estes custos externos, para a tomada de decisão em como investir em meios de transporte.
O CUSTO TOTAL DAS DESLOCAÇÕES EM AUTOMÓVEL
É MAIS DE SEIS VEZES SUPERIOR AO DAS DESLOCAÇÕES EM BICICLETA
Os custos caem em duas categorias: os que são suportados directamente pelo indivíduo, tais como o tempo de viagem, o preço do bilhete de transportes públicos ou a manutenção do carro; e aqueles que são suportados pela sociedade, como custos com poluição ou custos no tratamento de vítimas de acidentes.
Em Copenhaga, contabilizando custos e benefícios totais, 1 km percorrido de bicicleta custa ao utilizador €0.24 e tem um benefício de €0.16 para a sociedade, e 1 km percorrido de automóvel custa ao indivíduo €0.51 e à sociedade €0.15, recebendo o estado €0.16 em impostos. O custo das deslocações em automóvel, €0.50/km, é, assim, mais de seis vezes superior ao das deslocações em bicicleta, €0.08/km[2].
Para os automobilistas, as parcelas mais importantes são o custo de tempo e os custos operacionais do veículo (combustível, manutenção e depreciação). Os custos para a sociedade da utilização do automóvel provêm maioritariamente das externalidades já atrás referidas. Para os utilizadores de bicicleta, o custo de tempo e os benefícios em termos de saúde e de aumento de esperança de vida são os factores mais relevantes. Para a sociedade, os benefícios da utilização da bicicleta provêm principalmente da redução de custos de saúde [2]. Um estudo inglês concluiu que se a taxa de utilização de bicicleta fosse igual à holandesa, o serviço de saúde britânico teria uma redução de mil milhões de Euros nos custos anuais [3]. Na cidade de Copenhaga (cerca de 600 mil habitantes), os benefícios sociais da utilização da bicicleta estão avaliados em 230 milhões de Euros por ano [2].
SUBSTITUIR AUTOMÓVEIS POR BICICLETAS SIGNIFICA
LIBERTAR 70% DO ESPAÇO OCUPADO POR ESTRADAS E QUASE 90% DO OCUPADO POR ESTACIONAMENTOS
O custo do tempo associado à utilização da bicicleta pode ser reduzido através do desenvolvimento de infraestruturas e restruturação urbana em favor dessa utilização. Copenhaga está a criar “auto-estradas” para bicicletas de forma a aumentar a velocidade das deslocações.
Um estudo do mesmo género da cidade de Vancouver, também contabilizando custos e benefícios totais de vários modos de transporte, concluiu que por cada dólar que os automobilistas pagam de taxas e impostos directos, a sociedade tem de pôr 9.2 dólares. Por cada dólar que os utilizadores de autocarro contribuem, a sociedade põe 1.5 dólares. Por cada dólar que utilizadores de bicicleta ou quem se desloca a pé põem no sistema, a sociedade apenas tem de pôr, respectivamente, 8 e 1 cêntimos de dólar [4].
Este tipo de análise, de atribuir valor monetário a custos e benefícios menos tangíveis é conhecida por full-cost accounting, e pode levar ao conceito de “interiorizar as externalidades”. A ideia é de que se os indivíduos pagarem directamente um valor que inclua os custos escondidos para a sociedade da sua escolha de modo de transporte, passarão a considerá-los quando decidirem como deslocar-se. Na falta de mecanismos que nos forcem a pagar directamente pelo impacto global da forma como nos deslocamos, temos a tendência para subvalorizar os custos, para nós próprios e para a sociedade [4].
A análise de Copenhaga contabiliza a deterioração das estradas, mas não a sua construção. Uma bicicleta ocupa na estrada um quinto do espaço do de um carro, e dado os automóveis em média transportarem 1.5 pessoas, as bicicletas são mais de três vezes mais eficientes em termos de ocupação de espaço por pessoa. Os automóveis passam 80% do seu tempo parados, e sendo o espaço de estacionamento para um carro suficiente para 10 a 12 bicicletas, o estacionamento para bicicletas pode ser 8 vezes mais eficiente por pessoa [3]. Substituir automóveis por bicicletas significa, então, libertar 70% do espaço ocupado por estradas e quase 90% do ocupado por estacionamentos, com a provavelmente equivalente redução de custos.
Um lugar de estacionamento de automóveis que seja substituído por estacionamento para 10 bicicletas, se estiver cheio, está na realidade a libertar o espaço de 5.7 automóveis, ou, se for esse o interesse, a criar espaço para mais 5.7 automóveis e 8.5 pessoas do que anteriormente.
INVESTIMENTO EM CONDIÇÕES QUE FAVORECEM A UTILIZAÇÃO DA BICICLETA SÃO ECONOMICAMENTE JUSTIFICADAS E TEM ELEVADOS NÍVEIS DE RETORNO
A maior proximidade das pessoas, que estacionamentos para bicicletas e vias cicláveis originam, é óptima para o comércio. Quando Nova York recentemente introduziu as vias cicláveis segregadas, o comércio nessas ruas aumentou em 24%. Em termos mais globais, um estudo americano concluiu que cada milhão de dólares investido em infraestruturas para bicicletas criou 11.4 empregos, comparado com 7.8 empregos criados por investimentos em estradas [3].
A experiência de Copenhaga tem mostrado que investimento em infraestruturas para bicicletas, em segurança e em políticas que favorecem a sua utilização são economicamente justificadas, causando elevados níveis de retorno [2]. Investir na utilização da bicicleta é bom para o nosso sistema de transportes como um todo, para a economia local, para a inclusão social e para a saúde pública. E investir na utilização da bicicleta não significa maior esforço financeiro, antes pelo contrário, e como visto atrás, significa menor esforço, que por sua vez pode ser alocado para outras coisas. Exija-o à sua autarquia e ao governo central!
[1] H. van Essen et al., External costs of transportation in Europe, CE Delft, INFRAS e Fraunhofer ISI, 2011.
[2] S. Gossling e A. S. Choi, Transport transitions in Copenhagen: Comparing the cost of cars and bicycles, Ecological Economics 113, 2015.
[3] R. Aldred, Beneficts of Investing in Cycling, British Cycling, 2014.
[4] G. Steward-Wilson et al., What is the full cost of your cummute?, Moving Forward, 2015.
Rui Igreja
(Artigo cedido pelo Ciclaveiro, originalmente publicado no Diário de Aveiro de 08/08/2015)