A primeira vez

No início de cada mês, ali para os lados de Santa Tecla, a Braga Ciclável, numa iniciativa em parceria com a Junta de Freguesia de São Victor, ensina crianças, jovens e adultos a andar de bicicleta. É um momento único de partilha e aprendizagem, que a todos tem proporcionado a experiências inesquecíveis e, sobretudo a quem aprende, a oportunidade de descobrir um mundo novo.

A minha filha, a caminho dos seus 8 anos, tem sido também uma aluna dedicada nessas aulas. Como muitas outras crianças, esforçou-se por aprender a equilibrar-se em cima da bicicleta, a não olhar constantemente para o chão, a segurar o guiador de forma firme, a colocar o pedal em posição, a travar… Todos aqueles pequenos passos que hoje nos parecem simples e automáticos, mas que na verdade levam tempo a dominar!

Na última aula, conseguiu finalmente pedalar e, claro, durante todo o dia, não conseguia esconder a alegria imensa e o entusiasmo por ter vencido um obstáculo que antes lhe parecia gigante e quase intransponível. Queria uma bicicleta! Queria poder pedalar mais vezes! E queria que eu fosse com ela – passear, ir às compras, ou até para a escola. Rapidamente sentiu que a bicicleta era algo bom e que queria aproveitar mais. Sabe bem das suas vantagens e muitas vezes me viu a utilizá-la para as minhas deslocações diárias cá em Braga. Mas, agora, sabe-o na primeira pessoa: a bicicleta é algo muito especial.

Como qualquer pai, fiquei feliz pelo sucesso e por aquela alegria repentina. Mas fiquei também apreensivo ao notar que, apesar de cada vez haver mais utilizadores de bicicleta em Braga e em Portugal, a nossa rede viária e até mesmo as nossas áreas residenciais continuam a ser francamente deficientes em termos de segurança e conforto para quem se desloca a pé ou de bicicleta.

Ir de bicicleta para a escola, quando esta fica a 1 ou 2km de casa, não pode ser uma viagem arriscada. Algo vai mal quando assim acontece. Mas a realidade é que continua a haver demasiados obstáculos e muitos perigos para os modos suaves, ao mesmo tempo que se continuam a desperdiçar todos os anos verdadeiras exorbitâncias para facilitar e incentivar o uso excessivo do automóvel. Não temos em Braga uma rede ciclável, e as poucas medidas que têm sido implementadas, em termos de infraestrutura destinada ao uso da bicicleta, são avulsas e tecnicamente discutíveis. A cidade continua demasiado fragmentada e perigosa, quando pela sua dimensão, orografia e condições climatéricas tem tudo o que é necessário para ser uma cidade modelo no uso da bicicleta transporte.

Em 2021, já ninguém tem dúvidas quanto à necessidade de recuperar para as pessoas o espaço público urbano e de tornar mais seguras todas as ruas e avenidas, reduzindo em primeiro lugar a velocidade e intensidade do tráfego motorizado. Hoje em dia, todos sabemos que isso contribui para uma maior fluidez, menos acidentes, menos filas e, simultaneamente, permite acolher melhor todos os cidadãos, independentemente do modo de transporte que num ou noutro momento utilizem, seja a pé, de bicicleta, carro, mota ou transportes públicos.

E no final de contas, que cidade queremos oferecer aos nossos filhos?

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